“… não existe essa coisa de sociedade. Há indivíduos, homens, mulheres e famílias. E nenhum governo pode fazer alguma coisa que não seja através das pessoas, mas estas precisam cuidar de si em primeiro lugar.” – Margaret Thatcher, Women’s Own Magazine, 03/10/ 1987.
“As elites meritocráticas têm dificuldades em vislumbrar a existência de uma comunidade …” – Christopher Lasch, The Revolt of the Elites and the Betrayal of Democracy (1994)
Neoliberalismo e o Estado para os Ricos
A ascensão ao poder de Margaret Thatcher (1979) e Ronald Reagan (1981) é usualmente apontada como o início da era neoliberal. As elites passaram a repudiar as políticas que garantiram a crescente coesão social nas décadas de 1950 a 1970, particularmente nos países de alta renda. Thatcher, inspirada por Hayek e os intelectuais libertários da “Mont Pèlerim Society”, estava convencida de que o Estado britânico concedia benefícios excessivos à sua população. Os custos sobre os “geradores da riqueza”, que para ela eram as classes proprietárias, seriam excessivos. Impostos demais minariam o crescimento econômico e a geração de empregos. A regulação estatal desincentivaria os empreendedores e a inovação. Para relançar o país em uma nova era de prosperidade, haveria de ser reduzir o papel do Estado na economia, enfrentar os interesses particulares, especialmente dos sindicatos de trabalhadores, e desregular a economia. Com Thatcher, o mantra neoliberal ecoou forte no mundo: liberdade para a riqueza privada!
Nos Estados Unidos, economistas como Arthur Laffer, Milton Friedman, James M. Buchanan, George Stigler, dentre outros, ajudaram no desenho e no aprofundamento das políticas do “Supply-Side Economics”. Estas tornaram-se predominantes nas décadas seguintes, com resultados que se revelaram muito aquém daqueles anunciados por seus proponentes. As economias avançadas cresceram muito menos entre 1980 e 2020 do que nas décadas do pós-guerra. A produtividade do trabalho também foi muito pior. O emprego cresceu, porém, as rendas do trabalho ficaram estagnadas, especialmente para os quartis inferiores da distribuição populacional. Já a concentração se aprofundou, com a maior parte dos incrementos de renda sendo canalizados para o decil (ou mesmo, do percentil) superior da distribuição populacional. Assim, tais políticas funcionaram muito bem para uma parcela restrita das populações dos países de alta renda. Para o restante da sociedade, especialmente as classes não proprietárias, os ganhos foram assimétricos: as rendas do trabalho não cresceram, particularmente para os trabalhadores de menor escolaridade e os agrupamentos étnico-raciais específicos.
É um equívoco assumir-se que, na era neoliberal, o Estado tornou-se mínimo de forma genérica ou mesmo que deixou de intervir na economia. Análises mais cuidadosas e atentas às evidências empíricas revelam que o mais adequado seria dizer que o neoliberalismo implicou na utilização do Estado para direcionar a riqueza socialmente criada para segmentos específicos, cujos ganhos são potencializados por determinadas formas de regulação, tributação e gasto. Há a compressão de gastos sociais diversos e de investimentos na infraestrutura (estradas, comunicação, saneamento, prédios públicos como escolas, hospitais, equipamento de lazer e esporte etc.), alguns dos quais repassados ao setor privado por meio das privatizações; e a ampliação de impostos sobre as rendas do trabalho em detrimento das rendas da propriedade financeira, bem como o aumento da dívida pública.
Um exemplo recente ilustra esse ponto. Em pouco mais de uma década tivemos as duas maiores crises econômicas globais em quase um século: a crise financeira de 2007-2009; e os efeitos econômicos da pandemia do Covid 19 (em curso). Nos dois casos, os instrumentos da intervenção estatal foram utilizados da forma mais larga e pouco convencional de que se tem registro. Os maiores bancos centrais do mundo injetaram em suas economias mais de US$ 20 trilhões de dólares entre 2007 e 2021, que se direcionaram para a aquisição de títulos privados, públicos e ações de empresas. Com isso, não somente sustentaram os preços de tais ativos, como lançaram (ou sustentaram) o maior ciclo de alta dos preços das ações nos Estados Unidos, bem como movimentos altistas em diversas outras categorias de ativos e de mercados. Por isso mesmo, os relatórios de bancos de investimento que mapeiam o patrimônio dos mais ricos do mundo detectaram a preservação e a ampliação da riqueza privada nestes tempos de tamanha turbulência.
O “Global Wealth Report 2020”, do Credit Suisse, estimava que, no final de 2019, havia 52 milhões de milionários no mundo com um estoque de riqueza (imóveis, ações, instrumentos de dívida etc.) estimado em US$ 399 trilhões. Entre janeiro e março de 2020, a forte queda nos preços dos ativos decorrente da primeira onda da pandemia do Covid-19, produziu uma redução de US$ 17,5 trilhões naquele montante. Todavia, a rápida e intensa atuação estatal por meio dos bancos centrais fez com que, já no segundo trimestre de 2020, o valor de mercado dos ativos das famílias mais ricas do mundo tenha se recuperado plenamente. A crise da Covid fez a renda global cair em -4%, sem afetar o valor nocional do estoque de riqueza privada.
Em valores correntes de mercado o estoque de riqueza cresceu em média 6,6% a.a, passando de US$ 117 trilhões (2000) para os US$ 399 trilhões (2019-2020). Já a renda global avançou 3,8% a.a., variando entre US$ 34 trilhões para US$ 87 trilhões. Com isso a relação estoque de riqueza/renda passou de 3,4 vezes para 4,6 vezes. Por essa e outras razões, amplamente analisadas no “Capital no Século XXI”, os indicadores disponibilizados pelas bases de dados desenvolvida de Piketty (World Inequality Database) e Solt (The Standardized World Income Inequality Database) sugerem que o movimento de reconcentração da renda e da riqueza, inaugurado nos anos 1980, manteve-se por pelo menos quatro décadas.
Biden Vai Reverter a “Rebelião das Elites”?
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou sua intenção de aumentar impostos para grandes corporações e para os indivíduos que ganham pelo menos um milhão de dólares/ano. A justificativa é dar sustentação fiscal de longo prazo ao “American Jobs Plan”, seu plano de investimentos (US$ 2,3 trilhões) para recuperar a infraestrutura física, melhorar a área de ciência e tecnologia e qualificar da força de trabalho. O financiamento desta estratégia passaria pelo aumento da dívida pública, pelo menos no curto prazo. Já para estabilizar a trajetória dívida/PIB no longo prazo, além de apostar na possibilidade de o plano incrementar o crescimento da renda (o denominador da relação), espera-se ampliar a arrecadação de impostos incidentes sobre a “elite”, o que amorteceria o crescimento do denominador, em conjunto com a manutenção de juros baixos. O novo teto para a tributação dos ganhos de capital chegaria a 39,6%, que somado à sobretaxa já existente, geraria uma margem limite de 43,6%, mais do que o dobro dos atuais 20%. Adicionalmente, seriam também reconstituídos parte dos impostos sobre os lucros das corporações, previamente reduzidos pela reforma tributária de 2017.
A ambição de Biden, tanto pelo lado do gasto, quanto do seu financiamento, converge com o que já vem sendo dito há mais de um ano pelos porta vozes do establishment, como o Financial Times, a The Economist, o Fórum Econômico Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI), para citar alguns, além de um crescente número de economistas das diversas correntes analíticas. Defende-se, de forma cada vez mais explícita e intensa, a adoção de mudanças radicais na gestão econômica, especialmente no que tange à necessidade de se investir em melhores serviços públicos, de se proteger indivíduos que atuam em um mercado de trabalho cada vez mais instável, e de ampliar a taxação ganhos de capital, grandes corporações e heranças. Biden não é uma voz isolada.
O Fundo Monetário Internacional, em publicações recentes como o Monitor Fiscal e o Panorama da Economia Global (abril de 2021), expressa a mesma visão. Enfatiza-se que o problema estrutural da desigualdade distributiva se aprofundou com a pandemia. Defende-se o ativismo estatal para mitigar este problema, bem como aponta-se para a necessidade de ampliar investimentos públicos, tanto para dar sustentabilidade à potencial recuperação cíclica, quanto para enfrentar temas como o baixo dinamismo econômico e a grave crise ambiental em curso.
A agenda normativa que emerge do FMI enfatiza a necessidade de se investir mais e melhor em educação, saúde e o desenvolvimento da primeira infância; ampliar as redes de proteção social para famílias mais vulneráveis às crises socioeconômicas; melhorar a arrecadação tributária, inclusive com a maior taxação do patrimônio (estoque de riqueza e herança); dar maior transparência à gestão fiscal; e fortalecer a cooperação internacional como forma de se alcançar as metas do “Desenvolvimento Global Sustentável” até 2030. O FMI estima investimentos da ordem de US$ 3 trilhões (ou 2,6% do PIB global projetado para 2030) para que tal intento se concretize em 121 países de renda baixa e média.
Na visão renovada do Fundo, tributar heranças e grandes fortunas deixou de ser um problema e passou a encarnar a possibilidade de manutenção de um mínimo de coesão social nesta era de turbulências. Já os pesquisadores Emmanuel Saez e Gabriel Zucman propõem a introdução de uma alíquota global adicional de 0,2% sobre o valor de mercado das grandes empresas de capital aberto. Vale dizer, para além da taxação nos ganhos de capital dos acionistas, foco da proposta de Biden, as empresas também teriam de ampliar a sua contribuição para a recuperação global. Até porque, seu valor de mercado tem sido sustentado diretamente pela ação dos Bancos Centrais. Saez e Zucman estimam a possibilidade de se arrecadar, somente com este mecanismo, cerca de US$ 180 bilhões/ano, posto que a capitalização atual do mercado acionário é de cerca de US$ 90 trilhões.
Neste sentido, as análises do Fundo e de pesquisadores independentes convergem com a perspectiva do brilhante economista John Maynard Keynes. Na conclusão de sua Teoria Geral (1936), Keynes afirmava ser equivocado supor que a expansão da riqueza material nas modernas sociedades de mercado advém da ampliação da propensão a poupar das elites. Pelo contrário, o acúmulo de riqueza nas mãos de poucos, particularmente pelo mecanismo da herança só ampliaria as desigualdades e reduziria o potencial de dinamismo econômico. Conclusão semelhante aparece nos trabalhos de Thomas Piketty e nos diversos estudos recentes sobre mobilidade social e desigualdade.
Pela ótica da meritocracia, a concentração da riqueza no capitalismo se justificaria pela ideia de que o maior esforço de determinados indivíduos deveria ser acompanhado de recompensas também proporcionalmente maiores. E que, adicionalmente, a canalização destes recursos para novos empreendimentos, que ampliam o estoque de capital e as inovações, geraria ganhos coletivos de maior dinamismo econômico. Sem desconsiderar a pertinência dessa possibilidade, Keynes alerta para o fato de que raciocínio semelhante não faz sentido na transferência intergeracional de riqueza pelo mecanismo da herança. Vale dizer, o mérito não seria um atributo intergeracional.
Em novembro de 2017, a prestigiosa revista The Economist abordou este mesmo assunto ao apresentar o dilema de “como equilibrar o desejo das pessoas em legar ativos para as gerações subsequentes” com o caráter potencialmente injusto desta taxação sobre a liberdade de acumular. Na ótica anglo-saxônica, a tributação da herança seria considerada “a menos justa”. Para a The Economist, dois princípios liberais se contrapõem no tema da tributação das heranças: por um lado, a defesa do direito de propriedade e do seu uso, sem a interferência arbitrária do poder estatal; por outro, a própria ideia de mérito individual, na medida que a existência de uma elite permanente e hereditária vai de encontro à visão de que as forças de mercado no capitalismo garantem a mobilidade social ascendente a todos os que se empenharem o suficiente. A solução sugerida é preservar o direito de herança, mas nos marcos da existência de um sistema tributário “justo”, vale dizer, em que esta seja devidamente taxada.
A despeito da retórica liberal esclarecida, na prática a era neoliberal redundou no esforço de reduzir, ou mesmo de eliminar a tributação sobre a herança e a riqueza financeira em geral. Se o quadro mais amplo nos informa que, em média, e nos países da OCDE, a taxa média de arrecadação tributária passou de 24% (1964) das respectivas rendas, para 34% (2019); a composição dessa taxa se alterou, com a incidência sobre o patrimônio, que correspondia a 10% do total arrecadado nos anos 1960, para menos de 5% da arrecadação atualmente. A contribuição da tributação sobre as rendas do trabalho e o consumo final ocupou o espaço previamente reservado à tributação do patrimônio.
No caso paradigmático dos Estados Unidos, o somatório dos impostos sobre lucros das empresas e o patrimônio de pessoas físicas (incluindo heranças) e jurídicas, passou de 7,5% do PIB (ou 30% da arrecadação total) na média 1965-1970, para 4% do PIB (ou 16% do total arrecadado) no período que se seguiu à reforma tributária da administração Trump (Tax Cuts and Jobs Act, 2017). O mais recente governo republicano conseguiu fazer com que a arrecadação geral do setor público recuasse como proporção do PIB aos patamares historicamente mais baixos dos pós-guerra, que usualmente correspondem aos governos do GOP (Grand Old Party). Com Trump, a arrecadação sobre as heranças atingiu 0,1% do PIB (ou 0,5% do total arrecadado), valor que corresponde ao piso na série histórica da OCDE.
A existência de paraísos fiscais e de complexas legislações tributárias que legalizam a evasão de pagamentos, permite com que a riqueza privada seja protegida nos marcos da globalização dos mercados financeiros. Por isso, das medidas anunciadas por Biden, a que mais causa reações contrárias é a intenção reverter os ganhos tributários por décadas de políticas pró-capital. A ampliação nos impostos sobre lucros, ganhos de capital, bem como o desejo de estabelecer pisos mínimos globais para tributação dos lucros das corporações e da riqueza dos indivíduos, podem repor algo como 1/3 dos cortes já realizados na tributação sobre os ricos na era neoliberal. Nada muito radical, quando se analisa em uma perspectiva estritamente racional. Pelo lado do gasto, a ambição da nova administração também é moderada, com ampliação de investimentos em infraestrutura da ordem de 1% do PIB estadunidense ao ano, em um horizonte de oito anos. Isso apenas reporia os níveis de investimento público dos anos que antecederam a chegada de Reagan ao poder.
A eventual emergência de um novo Consenso de Washington, mais propenso a garantir um mínimo de coesão social por meios de investimentos públicos e taxação mais progressiva da renda e da riqueza, fez com que as elites que se rebelaram contra o Estado de Bem-Estar Social, voltassem a entoar o mantra de que tais medidas gerarão menos crescimento e mais desemprego. Senadores da oposição republicana têm se manifestado de forma veemente de que se o sistema “não está quebrado e que, portanto, não precisaria ser consertado” por Biden O senador republicano Chuck Grassley, que já foi líder do Comitê de Finanças do Senado, e que está nesta casa desde 1981, argumenta que o aumento de impostos sobre os ricos gerará a “redução do investimento” e o “aumento do desemprego”. A Curva de Laffer segue viva na retórica conservadora nos EUA. Porém, como a realidade é por demais teimosa, qualquer análise empírica dos anos Trump ou da longa era neoliberal mostrará que os investimentos produtivos privados estão em queda há décadas, ao passo que a valorização dos ativos financeiros cresceu exponencialmente. As isenções fiscais para os ricos estadunidenses possivelmente não promoveram mais investimentos produtivos, incrementos de produtividade e prosperidade para o conjunto da sociedade.
Pelo menos esses são os dados do insuspeito banco de Investimentos JP Morgan. Seus economistas calcularam a relação entre os ativos financeiros e o PIB estadunidense e verificaram que, entre 1951 e 1980, tal indicador oscilou entre 2 e 3, vale dizer, o estoque de riqueza financeira era equivalente a duas ou três vezes a renda anual total do país. Depois de Reagan, reorganização do Estado para servir aos ricos fez com que esse indicador atingisse o seu pico em 2021 (6 vezes). Já incremento médio dos investimentos produtivos (variação do estoque privado de capital não-residencial) que fora de 3,5% a.a. entre 1955 e 1980, atingiu patamares médios de 1,5% a.a. na década de 2010.
O indicador de participação dos 10% mais ricos do país na renda antes do pagamento de impostos passou de 35% (média 1951-1980) para o pico atual de 55%. De fato, o mantra do “Supply-side Economics” reverberado pelos mais influentes e longevos senadores do Partido Republicano é uma verdade absoluta para 10% da população do país: a redução da tributação dos ricos produziu a maior elevação na riqueza da elite em mais de sete décadas. Por que então querer “consertar” o que está dando tão certo?
Depois de anos de frustração com o bloqueio dos Republicanos às medidas mais progressistas de Obama, o agravamento no quadro de radicalização política da sociedade e a incapacidade de fazer frente ao avanço chinês, Biden resolveu avançar na agenda de reestruturação das políticas públicas. Nestes novos marcos, parece levar à sério a sua promessa de campanha de que a tributação sobre as rendas do trabalho não poderia ser superior à taxação dos ganhos financeiros. O crescimento dos lucros (e do estoque de capital) acima da expansão real dos salários é uma das principais fontes do crescente fosso econômico e social que divide as sociedades capitalistas mais desenvolvidas.
Os novos ventos que sopram nos círculos oficiais internacionais e na academia estadunidense, bem como os passos já dados pela administração Biden sugerem que o neoliberalismo se tornou disfuncional para a própria reprodução da sociedade de mercado em sua moderna encarnação. Isso porque, os problemas ambientais, sociais e econômicos acumulados nas últimas décadas já estão cobrando um preço elevado demais e tenderão a gerar cenários potenciais ainda mais disruptivos. Pelo menos é isso o que se depreende a leitura dos estrategistas do National Intelligence Council, cujo estudo recém-lançado, “Global Trends 2040: a more contested world” nos lembra que os riscos são crescentes e as capacidades estatais para enfrentá-los precisam de renovação e fortalecimento.
Assim, em um mundo de “maior contestação”, a preservação da democracia liberal e do próprio establishment, passaria pela reinvenção do Estado em todas as suas esferas de atuação. Na regulação, dever-se-ia buscar reduzir as assimetrias de poder de mercado, hoje potencializadas pela expansão das megaempresas, particularmente nas áreas de alta tecnologia. No gasto, revitalizar coesão social e avançar em novas áreas de infraestrutura que adaptam as sociedades modernas à realidade dramática das mudanças climáticas. E, por fim, na dimensão da arrecadação, bloquear o veto as elites à mobilidade social ascendente, com ampliação ainda mais ambiciosa da tributação sobre grandes fortunas, rendas financeiras e herança.
Christopher Lasch, o brilhante historiador e crítico social estadunidense, precocemente falecido em 1994, nos legou com sua última obra em vida, uma análise profunda do descolamento social, cultural, econômico e moral das elites modernas com respeito ao conjunto da sociedade. Sem o compromisso intergeracional de preservá-la, as novas classes afluentes, libertas do jugo da regulação estatal e da tributação progressista, floresceram na era liberal. Os custos deste experimento libertário se ampliaram com o passar do tempo. Reverter os estragos da “rebelião das elites” é a agenda mínima para a preservação de patamares aceitáveis para a reprodução da vida social nessa era de turbulências. O fracasso em fazê-lo tem o potencial de nos levar de volta para um período de conflitos permanentes, em um jogo global de soma negativa.
André Moreira Cunha é Doutor em Economia pela Unicamp e Professor Associado do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS.
Andrés Ferrari Haines é professor Adjunto do Departamento de Economia e Relações Internacionais, Faculdade de Ciências Econômicas e do Programa de Pós-graduação em Estudos Estratégicos Internacionais (PPGEEI-UFRGS). Integrante do Núcleo de Estudos dos BRICS (NEBRICS-UFRGA) e Poder Global e Geopolítica do Capitalismo (aferrari@ufrgs.br).
Publicado originalmente em: https://www.sul21.com.br/opiniaopublica/2021/04/biden-e-a-rebeliao-das-elites-por-andre-moreira-cunha-e-andres-ferrari/